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Carbapenemases: passado, presente e futuro

As moléculas de carbapenêmicos representam a última linha contra infecções por bactérias Gram negativas (BGN) multirresistentes, como aquelas produtoras de AmpC e Beta-lactamases de espectro estendido (ESBL), por exemplo. Entretanto, após os anos 2000, com o aumento das infecções por BGN produtoras de ESBL e AmpC, o uso dos carbapenêmicos tem sido frequente, justificando também o aumento dos casos de Enterobacterales resistentes aos carbapenêmicos (CRE).1-4 

Antes dos anos 2000 não havia nenhuma recomendação específica em relação aos testes de detecção de carbapenemases para os laboratórios clínicos.5 No início da década de 2000, Klebsiella pneumoniae produtora de carbapenemase (KPC) foi reconhecida como uma ameaça, uma vez que os pontos de corte clínicos para determinação da sensibilidade aos carbapenêmicos não previam uma correlação quando as concentrações inibitórias mínimas (CIMs) elevadas de carbapenêmicos eram reportadas, evidenciando um grande desafio em correlacionar a presença do gene KPC com a expressão da resistência aos carbapenêmicos no antibiograma.5

Em 2009, o Clinical Laboratory Standards Institute (CLSI) introduziu a recomendação do teste de Hodge modificado (MHT) para detecção da produção de carbapenemase em Enterobacteriaceae (atualmente, Enterobacterales) apresentando CIMs elevadas para os carbapenêmicos, instruindo os laboratórios a editar todos os resultados de carbapenêmicos para resistente quando o MHT apresentasse resultado positivo. No ano seguinte (2010), os pontos de corte dos carbapenêmicos para Enterobacterales foram revisados, bem como a recomendação para realização do MHT foi modificada para "opcional" e para “controle de infecção/epidemiologia”. 6,7

No ano de 2012, os pontos de corte dos carbapenêmicos para Pseudomonas aeruginosa foram revisados e o teste Carba NP foi introduzido para detecção de carbapenemases em Enterobacterales, P. aeruginosa e Acinetobacter spp.5

O Comitê Europeu de Teste de Sensibilidade aos Antimicrobianos/European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing (EUCAST) publicou, em 2013, a primeira versão do documento com as diretrizes para detecção de mecanismos de resistência e resistências específicas de importância clínica e/ou epidemiológica, com os pontos de corte clínicos e pontos de corte de triagem para Enterobacterales produtoras de carbapenemase e o teste de sinergismo com inibidores para a detecção de carbapenemases.8      

Em 2017, o CLSI introduziu o teste de modificação dos carbapenêmicos (mCIM) para Enterobacterales e em 2018 excluiu a recomendação do MHT e introduziu o eCIM para Enterobacterales, adicionando EDTA ao teste com a finalidade de auxiliar na detecção de carbapenemases da classe B (metalo-betalactamases).9,10 

Vale lembrar que as infecções causadas por microrganismos resistentes aos carbapenêmicos estão associadas a altas taxas de mortalidade, em grande parte devido à limitação de alternativas de tratamento.11 Sabemos que existem vários mecanismos relacionados à aquisição de resistência aos carbapenêmicos, entre os quais podemos destacar:12 

  • Perda de porina, que reduz a absorção de carbapenêmicos pela célula bacteriana; 
     
  • Bombas de efluxo, que promovem a extrusão do carbapenêmico para fora da bactéria;
     
  • Aquisição de genes codificadores das carbapenemases (enzimas com capacidade de hidrolisar as moléculas dos carbapenêmicos e outros antimicrobianos β-lactâmicos), os quais são carreados em transposons, plasmídeos ou outros elementos genéticos móveis, ou seja, que podem ser transferidos dentro da mesma espécie ou entre espécies diferentes, o que justifica a maior frequência desse mecanismo.12


As betalactamases são classificadas de acordo com as suas estruturas moleculares, divididas em classes A, B, C ou D. As classes A e D (serina-betalactamases) e a classe B (metalo-betalactamases, que utilizam zinco como cofator) contemplam enzimas com atividade de carbapenemase, enquanto que a classe C não apresenta atividade de carbapenemase. Essa informação é importante para entender as metodologias de detecção das enzimas no laboratório e correlacionar as moléculas de antimicrobianos que podem ou não inativar essas enzimas.13,14 

Conhecer a natureza dos determinantes da resistência aos carbapenêmicos é fundamental tanto para entender a dinâmica de sua disseminação e adoção das medidas de precaução de contato, quanto para fins diagnósticos e de orientação ao médico para otimização do tratamento.3,15

Deste modo, para mitigar esse desafio é fundamental que o laboratório de microbiologia conheça a epidemiologia local e adote uma ou mais metodologias de detecção de carbapenemase, que atendam às necessidades clínicas da instituição, de forma rápida e acurada. Além disso, a realização de antibiograma complementar deve ser consequência da identificação:16-18

  • Da espécie bacteriana; 
     
  • Da classe da carbapenemase detectada; 
     
  • Do sítio de infecção e, sobretudo, mediante solicitação médica.16-18

 
A detecção laboratorial da carbapenemase em Enterobacterales isoladas de amostras clínicas inicia-se com a triagem no antibiograma, observando a redução da sensibilidade aos carbapenêmicos, seja por disco difusão ou por meio da concentração inibitória mínima, utilizando os pontos de cortes clínicos padronizados pelo comitê vigente em cada instituição ou recomendação de cada país.19-21

Para tanto, é importante saber que ambos os testes têm variabilidade inerente, ou seja, a bactéria pode demonstrar sensibilidade aos carbapenêmicos e mesmo assim apresentar carbapenemase, fato mais comumente observado entre as enzimas OXA-48 e KPC. Para otimizar a triagem baseada no antibiograma, o EUCAST propôs pontos de corte de triagem para detecção de carbapenemases diferentes dos pontos de corte clínicos.19-21

Os testes confirmatórios de carbapenemases mais comumente utilizados na América Latina podem ser classificados em dois grupos:22 

Testes que detectam hidrólise do carbapenêmicos22

As variações desses testes (utilizando o EDTA) podem sugerir detecção de carbapenemases das classes A ou B. Neste grupo encontramos, por exemplo:22 

  • Teste de inativação do carbapenêmico modificado (mCIM e eCIM); 
     
  • Métodos colorimétricos (Carba NP / Blue Carba); 
     
  • Teste de sinergismo com inibidores como ácido fenilborônico (classe A) e EDTA para detecção de beta-lactamases (classe B). Esses testes podem apresentar alguns resultados falso-negativos, principalmente para oxacilininases, e resultados falso-positivos, que podem ocorrer devido à atividade de inibição de crescimento das bactérias pelo EDTA.22


Testes que detectam o tipo específico de enzima e a presença de várias enzimas22

Neste grupo encontramos, por exemplo:22

  • Testes imunocromatográficos comerciais; 
     
  • Métodos baseados na reação da polimerase em cadeia (PCR)


Existem vários testes comerciais baseados na detecção de genes de carbapenemases. A maior vantagem desses dois métodos é a detecção de coprodução, ou seja, o mesmo microrganismo apresentando mais de uma enzima como KPC e NDM ao mesmo tempo.  No entanto, esses métodos detectam um número limitado de alvos ou de variantes de enzimas.22

Alguns métodos são promissores, como a detecção de carbapenemase por espectrometria de massas Matrix-assisted laser desorption-ionization time-of-flight mass spectrometry (MALDITOF), entretanto, o custo da aquisição do equipamento, bem como a interpretação automatizada do tipo de enzima, são fatores limitantes para alguns laboratórios.1,22 Outro método de destaque é o sequenciamento de próxima geração (Next Generation Sequence-NGS) que pode fornecer uma ampla e abrangente detecção de genes codificadores de enzimas, embora ainda não seja uma realidade disponível na maioria dos laboratórios clínicos da América Latina.1,22
 
Após a detecção do tipo de carbapenemase, pode-se realizar teste de sensibilidade complementar com alguns antimicrobianos específicos, como polimixina B e ceftazidima-avibactam, e interpretá-los de acordo com os pontos de corte clínicos vigentes. Vale lembrar que algumas Enterobacterales como Serratia spp., Proteus spp., Morganella spp. e Providencia spp. apresentam resistência intrínseca à polimixina B, e que ceftazidima-avibactam não apresenta atividade contra as carbapenemases da classe B e contra algumas variantes de KPC.23 


Em conclusão, a detecção rápida e acurada dos tipos de carbapenemases em ERCs pelo laboratório de microbiologia é fundamental para o monitoramento da disseminação dessas enzimas, para orientação ao clínico quanto a otimização terapêutica e, consequentemente, para a redução das taxas de morbimortalidade por esses microrganismos multirresistentes, além de contribuir com o conhecimento da epidemiologia local e com a política de tratamento empírico no futuro.15,22 
 

Referências Bibliográficas

1. Elshamy AA, Aboshanab KM. A review on bacterial resistance to carbapenems: epidemiology, detection and treatment options. Future Sci. 2020;6(3).
2. Blair JM, Webber MA, Baylay AJ, Ogbolu DO, Piddock LJ. Molecular mechanisms of antibiotic resistance. Nat Rev Microbiol. 2015;13(1):42-51
3. Little ML, Qin X, Zerr DM, Weissman SJ. Molecular diversity in mechanisms of carbapenem resistance in paediatric Enterobacteriaceae. Int J Antimicrob Agents. 2012;39(1):52-57.
4. Nordmann P, Naas T, Poirel L. Global spread of Carbapenemase-producing Enterobacteriaceae. Emerg Infect Dis. 2011;17(10):1791-8.
5. Humphries RM. CIM City: the Game Continues for a Better Carbapenemase Test. J Clin Microbiol. 2019;57(7):e00353-19.
6. CLSI, 2009. Clinical and Laboratory Standards Institute. Performance Standards for Antimicrobial Susceptibility Testing. M100-S19. 
7. CLSI, 2010. Clinical and Laboratory Standards Institute. Performance Standards for Antimicrobial Susceptibility Testing M100-S20. 
8. EUCAST, 2013. European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing. Guidelines for detection of resistance mechanisms and specific resistances of clinical and / or epidemiological importance. V1.0. 
9. CLSI, 2017. Clinical and Laboratory Standards Institute. Performance Standards for Antimicrobial Susceptibility Testing M100-S27.
10. CLSI, 2018. CLinical and Laboratory Standards Institute. Performance Standards for Antimicrobial Susceptibility Testing M100-S28. 
11. Castanheira M, Deshpande LM, Mendes RE, Canton R, Sader HS, Jones RN. Variations in the Occurrence of Resistance Phenotypes and Carbapenemase Genes Among Enterobacteriaceae Isolates in 20 Years of the SENTRY Antimicrobial Surveillance Program. Open Forum Infect Dis. 2019;6(Suppl 1):S23-S33
12. Meletis G. Carbapenem resistance: overview of the problem and future perspectives. Ther Adv Infect Dis. 2016;3(1):15-21.
13. King DT, Sobhani Far S, Strynadka NC. The mechanisms of resistance to β-lactam antibiotics. In: Handbook of Antimicrobial Resistance. ed. New York, NY, USA: SpringeR. 2017.
14. Jacoby GA, Munoz-Price LS. The new beta-lactamases. N Engl J Med. 2005;352(4):380-91.
15. Logan LK, Weinstein RA. The Epidemiology of Carbapenem-Resistant Enterobacteriaceae: The Impact and Evolution of a Global Menace. J Infect Dis. 2017;215(suppl_1):S28-S36.
16. Gautier G, Guillard T, Podac B, Bercot B, Vernet-Garnier V, de Champs C. Detection of different classes of carbapenemases: Adaptation and assessment of a phenotypic method applied to Enterobacteriaceae, Pseudomonas aeruginosa and Acinetobacter baumannii, and proposal of a new algorithm. J Microbiol Methods. 2018;147:26-35.
17. Weinstein MP. Performance Standards for Antimicrobial Susceptibility Testing.. CLSI supplement M100 (28th Edition). Clinical and Laboratory Standards Institute, PA, USA. 2018
18. Morrill HJ, Pogue JM, Kaye KS, LaPlante KL. Treatment Options for Carbapenem-Resistant Enterobacteriaceae Infections. Open Forum Infect Dis. 2015;2(2):ofv050.
19. CLSI, 2021. Clinical and Laboratory Standards Institute.. Performance Standards for Antimicrobial Susceptibility Testing M100-S31. 
20. EUCAST, 2021. European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing. Breakpoint tables for interpretation of MICs and zone diameters Version 11.0. 
21. EUCAST, 2017. European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing. Guidelines for detection of resistance mechanisms and specific resistances of clinical and / or epidemiological importance. V2.0, p. 1–47.
22. García-Betancur JC, Appel TM, Esparza G, Gales AC, Levy-Hara G, Cornistein W, Vega S, Nuñez D, Cuellar L, Bavestrello L, Castañeda-Méndez PF, Villalobos-Vindas JM, Villegas MV. Update on the epidemiology of carbapenemases in Latin America and the Caribbean. Expert Rev Anti Infect Ther. 2021;19(2):197-213.
23. Di Bella S, Giacobbe DR, Maraolo AE, Viaggi V, Luzzati R, Bassetti M, Luzzaro F, Principe L. Resistance to ceftazidime/avibactam in infections and colonisations by KPC-producing Enterobacterales: a systematic review of observational clinical studies. J Glob Antimicrob Resist. 2021;25:268-281.


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