Além de contribuir com a educação da equipe médica sobre exames, trabalho também ajuda a reduzir custos 

Colaboração é a palavra-chave quando o assunto é o combate às bactérias multirresistentes. Enquanto médicos são responsáveis pela prescrição de antibióticos, este trabalho só pode ser feito de maneira eficaz e assertiva diante da realização e interpretação adequada de exames laboratoriais¹. 

É inegável, então, a importância dos laboratórios de microbiologia na realização de testes e outros serviços que contribuam para o diagnóstico, tratamento, monitoramento e prevenção de doenças¹.

De acordo com um artigo publicado pela Associação Americana de Química Clínica¹, os laboratoristas desempenham um papel essencial no fortalecimento do stewardship antimicrobiano por meio de três atividades-chaves, entre elas:

Relatório de Antibiograma: responsáveis pela coleta, organização e comunicação de dados de resistência, os laboratórios realizam o trabalho de vigilância sobre tendências locais de patógenos microbianos e padrões de suscetibilidade.¹

Informações específicas do paciente: ao identificar patógenos microbianos e realizar testes de suscetibilidade antimicrobiana, os laboratórios fornecem informações específicas para que a antibioticoterapia empírica possa ser melhor direcionada.¹

Qualidade das amostras e relatórios: as diretrizes e procedimentos laboratoriais que garantem a coleta e processamento de amostras de alta qualidade são importantes para limitar o uso desnecessário de antibióticos.¹ 


O papel dos laboratórios, segundo o CDC

No documento Atividades e Papéis-Chave da Equipe dos Laboratórios de Microbiologia nos Programas de Stewardship Antimicrobiano², o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos indica como os laboratoristas podem fortalecer os programas para o uso e manejo otimizado de antibióticos.

As recomendações fazem parte dos Elementos Centrais do Programa de Otimização do Uso de Antimicrobianos em Hospitais² e incluem, em linhas gerais: 

Compromisso da administração hospitalar: a equipe do laboratório de microbiologia deve ser integrada ao programa de stewardship antimicrobiano e usar seu conhecimento para colaborar com a otimização de diagnósticos, desenvolvimento de antibiogramas, introdução de novos exames e testes, assim como a educação da equipe médica.²

Educação:  promover a comunicação entre a equipe médica e laboratoristas, destacando como exames específicos devem ser utilizados para otimizar o diagnóstico, informar sobre características dos exames nos prontuários eletrônicos no momento do pedido, divulgar novos testes disponíveis no hospital e quando solicitá-los.²

Stewardship diagnóstico: melhorar práticas de solicitação de exames que impactem no uso e manejo otimizado de antibióticos, aperfeiçoando as combinações de testes indicados para cada caso, monitorar os principais índices de qualidade de amostras microbiológicas e realizar intervenções de controle de qualidade, reportar resultados do laboratório de microbiologia para encorajar a antibioticoterapia adequada, entre outras.²

Ação: certificar-se de que o programa de administração de antibióticos seja notificado sobre culturas positivas de locais do corpo estéreis, revisar regularmente a forma como testes de suscetibilidade antimicrobiana são realizados no laboratório, os medicamentos testados,
a interpretação e comunicação dos resultados.²

Notificações: cabe ao laboratório de microbiologia atualizar, pelo menos uma vez ao ano, os antibiogramas da instituição, de acordo com as diretrizes vigentes, apresentar apenas resultados para organismos e configurações com número suficiente de isolados testados, seguir procedimentos padronizados para evitar a duplicação de vários resultados de um mesmo paciente.²


Impactos econômicos do diagnóstico otimizado

Em um estudo publicado no jornal Infection Control & Hospital Epidemiology³, pesquisadores da Universidade da Califórnia e do Sistema de Saúde de San Diego analisaram como o diagnóstico otimizado pode ajudar a reduzir taxas de infecção e gastos com a saúde, por meio da identificação precisa de casos de infecção hospitalar por Clostridioides difficile.

• Infecções hospitalares causadas por C. difficile custam ao sistema de saúde dos Estados Unidos US$ 15 mil por paciente internado.³
   
• Em 2017, foram notificados 462.100 casos de C. difficile, com 20.500 mortes somente nos EUA.³

Ao analisar os dados coletados entre 2015 e 2018, os pesquisadores identificaram 127 casos de infecções hospitalares causadas por C. difficile no VA San Diego Healthcare System. O stewardship diagnóstico, em conjunto com outras medidas, ajudou a reduzir em cerca de 70% o número de casos, de 44 em 2015 para 13 em 2018³.

O número de dias de internação relacionados à bactéria também diminuiu de 596 para 332. Entre 2015 e 2018 houve, também, uma queda substancial nos custos de hospitalização - de US$ 2.780.681 para US$ 1.534.190) e tratamento (de US$ 7.158 para US$ 1.476) após a introdução da otimização diagnóstica com critérios de teste.³


Cientistas identificam chave para nova classe de antibióticos

Cientistas do University Hospital Frankfurt e da Goethe University Frankfurt, liderados pelo professor Volkhard Kempf,  deram o primeiro passo para desenvolver uma nova classe de antibióticos, a partir da observação de como bactérias da espécie Bartonella henselae aderem às células hospedeiras⁴. 

Sendo a adesão da bactéria às células hospedeiras o primeiro passo para o desenvolvimento de uma infecção, entender como isso ocorre permite a busca por alternativas terapêuticas capazes de bloquear essa interação o mais cedo possível.⁴

O mecanismo é explicado no artigo publicado no Microbiology Spectrum⁵, jornal da Sociedade Americana de Microbiologia. A descoberta é considerada a chave para se buscar alternativas terapêuticas que ajudem a bloquear essa interação o mais cedo possível. 


Doença da arranhadura do gato 

A Bartonella henselae é uma bactéria transmitida de animais para seres humanos. O patógeno é o causador da infecção conhecida como doença da arranhadura do gato.⁴ 

Para decifrar o mecanismo de adesão bacteriana, os cientistas usaram uma combinação de testes de adesão in vitro e proteômica de alto rendimento.⁴ 

• A proteômica é o estudo de todas as proteínas presentes em uma célula ou um organismo complexo.⁴

Durante a pesquisa, os cientistas notaram que a adesão bacteriana às células hospedeiras pode ser rastreada até a interação de uma certa classe de adesinas (adesinas autotransportadoras triméricas, ou TAA, em inglês) com a fibronectina, uma proteína frequentemente encontrada em tecidos humanos.⁵ 


A importância das adesinas

Complexos protéicos presentes na superfície das bactérias, as adesinas são responsáveis por reconhecer e se conectar às estruturas biológicas receptoras — também proteicas — do hospedeiro.⁴ 

• Os cientistas identificaram homólogos da adesina que também estão presentes em outros patógenos causadores de infecções.⁴ 

Um exemplo é a bactéria multirresistente Acinetobacter baumannii, que integra a lista de "agentes patogênicos prioritários" resistentes a antibióticos, segundo a Organização Mundial de Saúde.⁶  

Foram feitas análises de última geração nas proteínas, o que permitiu que os cientistas visualizassem os pontos exatos de interação entre as proteínas. A pesquisa também mostrou que o bloqueio experimental desses processos impede quase totalmente a adesão bacteriana.⁵ 

Na prática, isso significa que medicamentos capazes de evitar a adesão bacteriana a partir deste mecanismo podem se tornar uma alternativa promissora dentro da classe de antibióticos conhecidos como antiligantes.⁵

Referências:
1. Luther, Vera P. The Essential Role of Clinical Microbiology Laboratories in Antimicrobial Stewardship. American Association for Clinical Chemistry. 1º de agosto de 2015. Disponível em <https://www.aacc.org/cln/articles/2015/august/stewardship>. Acesso em 05/11/2022.
2. Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC). Atividades e Papeis-Chave da Equipe dos Laboratórios de Microbiologia nos Programas de Stewardship Antimicrobiano. Agosto de 2020. Disponível em <https://www.cdc.gov/antibiotic-use/pdfs/key-activities-laboratory-stewardship-508.pdf>. Acesso em 05/11/2022. 
3. Solanky D, Juang DK, Johns ST, Drobish IC, Mehta SR, Kumaraswamy M. Using diagnostic stewardship to reduce rates, healthcare expenditures and accurately identify cases of hospital-onset Clostridioides difficile infection. Infect Control Hosp Epidemiol. 2021 Jan;42(1):51-56. doi: 10.1017/ice.2020.375. 
4. Goethe Universitat. How bacteria adhere to cells: Basis for the development of a new class of antibiotics. 30 de junho de 2022. Disponível em <https://aktuelles.uni-frankfurt.de/englisch/how-bacteria-adhere-to-cells-basis-for-the-development-of-a-new-class-of-antibiotics/>. Acesso em 09/11/2022
 5. Vaca, D. J., Thibau, A., Leisegang, M. S., Malmström, J., Linke, D., Eble, J. A., Ballhorn, W., Schaller, M., Happonen, L., Kempf, V. A. J. Interaction of Bartonella henselae with Fibronectin Represents the Molecular Basis for Adhesion to Host Cells; Microbiology Spectrum. 18 de abril de 2022. https://doi.org/10.1128/spectrum.00598-22
6. Organização Pan-Americana de Saúde. OMS publica lista de bactérias para as quais se necessitam novos antibióticos urgentemente. 27 de fevereiro de 2017. Disponível em: <https://www.paho.org/pt/noticias/27-2-2017-oms-publica-lista-bacterias-para-quais-se-necessitam-novos-antibioticos>. Acesso em 07/11/2022.

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